Falávamos, domingo passado,
de dar para si e para os outros sempre novas chances, com o intuito de permitir
que as pessoas iniciem novas etapas construtivas em suas vidas. Numa clara
afronta à lei de Moisés, Jesus oferece uma nova chance a uma adúltera. Mas não
só para ela! Oferece uma nova chance também para os seus acusadores, bitolados
numa hermenêutica rígida da lei. O interessante é que tudo isso se dá na
esplanada do templo (v.2). O espaço sagrado reservado ao culto e ao cumprimento
rigoroso da lei acaba servindo como palco alternativo para o surgimento de
novas relações sociais e religiosas. Certamente João o faz com o claro intuito
de provar que ‘aquele templo’, com suas leis e cultos ‘idolátricos’, se
constitui no verdadeiro pecado de adultério. Os verdadeiros adúlteros, de fato,
são aqueles que frequentam e obedecem à rigidez do formalismo dos
sacrifícios e se esquecem da misericórdia e da justiça de Deus. Esquecem-se de
manter fidelidade ao Deus da compaixão e do amor. João cria uma esplêndida parábola
contrapondo o suposto infrator, a adúltera, - mas ela simboliza todos os que
desobedecem à lei formal, - e os supostos defensores e observantes da lei. No
cenário do templo que simboliza o aparato legitimador da lei e do sacerdócio
justicialista. Jesus aparece no centro de tudo como aquele que subverte a
finalidade da lei e do templo, espaço de adultério religioso, apontando seja
para a adúltera que para os seus acusadores não só a nova e inédita abordagem
da lei, mas, principalmente, a nova lógica e a nova prática ser seguida. Jesus
não age como um julgador movido pelo poder da lei, seja a favor ou bem como
contra ela. Tampouco se coloca acima dela, ignorando-a ou desprezando-a.
Simplesmente, age como alguém que se pauta a partir de ‘outros critérios’, algo
que a prática religiosa convencional ignora. E Ele o faz de forma construtiva,
e não pela via do contra-ataque, da contra-denúncia ou da contra-acusação.
De um lado mostra que o
pecado de adultério entendido de forma clássica (infidelidade conjugal) é
infinitamente menos grave que o pecado de infidelidade a Deus, aquele que se dá
cotidianamente naquele ‘bordel sagrado, o templo’. Ao provar que ninguém escapa
dessa situação de infidelidade, Jesus deixa entender que ninguém poderá se
arvorar em juiz dos outros. Que ninguém poderá apelar para nenhuma lei que
determina a morte do infrator, - mesmo sendo legalmente aprovada, - para
puni-lo. A lei humana jamais deverá ser utilizada para punir ou castigar o seu
suposto ou real infrator. Ao contrário, ela deverá ser utilizada como
instrumento pedagógico para que o infrator compreenda que de agora em diante
terá que construir vida e respeito lá onde ele semeou morte e violência.
Construir fraternidade e justiça lá onde dividiu, extorquiu e humilhou. A
parábola encerra-se com um oferecimento recíproco de novas chances para
recomeçar. Não somente a que Jesus oferece à ‘adúltera’, mas também a que os
acusadores oferecem para ela e para si próprios ao desistir de apedrejá-la e ao
voltar ao seu cotidiano com outra mentalidade. Um apelo recíproco para
construir uma nova prática de justiça. Não a justiça punitiva e a repressora,
mas a justiça que reconstrói relações e tecidos que haviam sido rompidos por
todos.
http://padrebombieri.blogspot.com.br/
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